O DOCUMENTO HISTÓRICO
KARNAL, Leandro; TATSCH, Flávia Galil. A memória evanescente. In: PINSKY, Carla; LUCA, Tânia de (orgs.). O historiador e suas fontes. São Paulo: Contexto, 2009. p. 19 – 28.
Leandro Karnal e Flávia Tatsch,
trazem-nos, no capítulo intitulado A
memória evanescente, presente na obra de Carla Pinsky e Tânia de Lucca, O historiador e suas fontes, o conceito
de documento histórico.
Inicialmente, elevando a importância
do documento como base para o julgamento histórico, para logo em seguida
indagar-nos: o que é um documento
histórico?
Desconstruindo a ideia de que um
documento histórico seria “uma folha de papel escrita por alguém importante”,
como muito se fez acreditar no passado, Karnal e Tatsch, lembram-nos que sem
documentos não há História.
Entretanto, a idéia de documento histórico
foi amplamente alargada, desde o advento da Escola dos Annales, responsável pela ruptura do paradigma da Escola Metódica,
que no século XIX certificava que o documento, seria em essência, o texto
escrito.
Somando-se ao documento escrito
clássico, defendido pela Escola Metódica, teríamos disponíveis também o
documento arqueológico, a fonte iconográfica, o relato oral e “todo e qualquer
mecanismo que possibilite uma interpretação”.
Tal ideia, segundo os autores, levou
além, não só a noção do documento histórico, como também o trabalho do historiador.
O documento tem tanta importância,
frente à História, que discutir o que é um documento histórico é estabelecer
qual memória deve ser preservada.
Diante disso, Karnal e Tastch se utilizam
da carta de Pero Vaz de Caminha, que durante mais de duzentos anos permaneceu
esquecida na Torre do Tombo, em Portugal, para somente em 1773 ser
(re)conhecida como documento histórico, sendo publicada somente em 1817,
alcançando “o cume da hierarquia documental”,exposta em vitrine hermética, com
iluminação e temperatura controladas.
Assim, observa-se a “construção
permanente” do documento histórico, onde importa, também, de um lado o valor do
texto, e do outro, o olhar de quem o lê, que, dependendo da leitura temporal,
pode gerar valores extremamente diferentes.
O documento, segundo Karnal e Tastch,
é responsável por criar uma conexão entre presente e passado, e o que não é
documento histórico hoje, poderá ser amanhã, dado a mutabilidade do sentido
conferido a ele. A concepção do documento histórico depende do meio social em
que se encontra. Vide a carta de Pero Vaz de Caminha, que em seu tempo não
passava de uma simples carta, sendo elevada ao patamar de documento histórico
alguns séculos depois.
De qualquer forma, todos os caminhos
tomados pelos Annales, estimularam a ampliação dos objetos históricos, cumprindo
o desejo de Marc Bloch. Além disso, transforma o papel do historiador, dando a
ele ares de detetive, que deve “extrair coisas que só aparecem de forma
indireta”.
Sintetizando a idéia de documento
histórico, Karnal e Tastch expõem a ideia de que qualquer fonte sobre o
passado, conservado por acidente ou propositalmente, analisado a partir do
presente e que possa criar diálogos com o passado é documento histórico.
Marc Bloch diria que sim.
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